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CACHORRO BARULHENTO

Decisão recente da 35º Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que a moradora de um determinado condomínio edilício retirasse seu cachorro do apartamento pelo fato do mesmo latir constantemente, causando perturbação aos vizinhos, sob pena de multa diária de R$ 700,00.

Como é sabido, condomínio é uma espécie de propriedade em que une mais de uma pessoa, titular de direito de propriedade, sobre o mesmo bem, sem que seja possível uma excluir a outra, dada igualdade de qualificação dos correspondentes direitos. Já Condomínio Edilício é uma das suas espécies o, regulado pelos artigos 1331 a 1338 do Código Civil, sendo aplicável a lei nº. 4591/64 nos assuntos não versados pelo diploma Civil.

Conforme relata Daniela Rosário Rodrigues (Direito Civil – direito das coisas, 3 ed., São Paulo: Rideel, 2010, p. 98):


“o que qualifica essa modalidade de condomínio para diferenciá-la das demais é o fato de que o que une os condôminos é a existência de uma área comum, na qual todos os condôminos são titulares do todo, havendo, a cada um deles, o direito a uma fração ideal ou quota-parte. Mas o elemento diferenciador é exatamente a existência de unidades autônomas, independentes, das quais casa condômino é proprietário exclusivo sem que haja a interferência dos demais”.

A maior parte das Convenções de Condomínio proíbe animais em apartamento, porém sobre estas prevalece o art. 19 da lei 4591/69 que traz o seguinte:

"Cada condômino tem o direito de usar e frui,r com exclusividade, sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionadas, umas e outros, ás normas de boa vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns, de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos ou moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos".

Isto porque o ser animal é visto como "bem de propriedade" pelo legislador brasileiro e, como tal, sua posse é um direito constitucional (art. 5°, XXII). Assim, o proprietário da unidade habitacional poderá ter seus animais em apartamento, tendo-se em vista que a Convenção não se sobrepõe á Carta Magna ou a uma Lei Federal.

Não se pode perder de vista que podem causar alguns transtornos aos demais condôminos tais como doenças, barulho, mau-cheiro, etc. Tirante estas hipóteses, no Judiciário e é cada vez mais freqüente as decisões favoráveis aos guardiões de animais, mesmo se houver proibição genérica da Convenção Condominial. Vejamos alguns exemplos:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. ANIMAL DOMÉSTICO. MANUTENÇÃO EM UNIDADE CONDOMINIAL. Inexistindo cláusula que vede a presença de animal no Condomínio, mas tão somente regras que criam restrições diante do inequívoco prejuízo causado aos demais condôminos, deve ser declarada a possibilidade de manutenção do animal quando a parte adversa, alheia ao princípio (art. 302, do CPC), não ataca a inexistência de comodidade aos demais co-proprietários. Recurso provido." (TJRJ - Apelação Cível - n.2002.001.28128 - 01/04/2003 - 11a. Câmara Cível - Des. José C. Figueiredo - Julgado em 12/02/2003.


"CIVIL - CONDOMÍNIO - PROIBIÇÃO DE MANUTENÇÃO DE ANIMAIS DOMÉSTICOS E AVES NOS APARTAMENTOS MULTA APLICADA A DUAS CONDÔMINAS - AÇÕES CONSIGNATÓRIA RIA E DE COBRANÇA APENSADAS E JULGADAS NA MESMA SENTENÇA COM PROCEDÊNCIA DA PRIMEIRO E IMPROCEDÊNCIA DAS OUTRAS - APELAÇÃO DO CONDOMÍNIO.
1. A cláusula de convenção condominial restritiva do direito de condômino ter animal doméstico em seu apartamento tem caráter meramente resguardativo e não impositivo absoluto e precisa ser interpretada de acordo com a relatividade que caracteriza o seu significado, devendo ser aplicada apenas naqueles casos em que o animal introduzido na comunidade condominial seja de grande porte e cause perturbação do sossego e do bem-estar ou ponha em risco a saúde dos vizinhos, não podendo de forma nenhuma ser aplicada á manutenção de um gato ou de um cão cocker spaniel em apartamento.

2. Apelação a que se nega provimento." (TJRJ - Apelação Cível - Número do Processo: 2003.001.00356 - Data de Registro : 15/04/2003 - Órgão Julgador: 16a. Câmara Cível - Des. DES. MIGUEL ANGELO BARROS - Julgado em 18/03/2003.


Maria Helena Diniz, em sua obra Código Civil Anotado, Saraiva, 1ª ed., 1995, p. 425-427, ensina que:

"Segundo Daibert, direitos de vizinhança são limitações impostas por normas jurídicas a propriedades individuais com o escopo de conciliar interesse de propriedade de vizinhos reduzindo os poderes inerentes ao domínio e de modo a regular a convivência social. Mau uso da propriedade vizinha - O mau uso é o uso anormal do direito, que cause dano a alguém (CC, art. 159). Se prejuízo houver do exercício anormal de um direito, ultrapassando os limites impostos á zona da garantia de cada um, cabe ao prejudicado o direito de reação. O critério de mau uso é contingente. Para determiná-lo, será preciso levar em conta as circunstâncias de cada caso, averiguando o grau de tolerabilidade, invocando o uso e os costumes locais, examinando a natureza do incômodo e a pré-ocupação


Vilson Rodrigues Alves, em sua obra Uso Nocivo da Propriedade, Ed. RT, 1ª ed., 1.992, p. 286-315, ensina que:


"Uso da propriedade divisa nocivo á segurança, ao sossego e á saúde vizinha. Ter animais em apartamento é questão que pode ser interpretada ora como nocivo da propriedade, ora como uso não-nocivo da propriedade".

(...)

Ainda na doutrina, Lauro Laertes de Oliveira indicou quatro requisitos á não-nocividade do uso da propriedade versando:

a) o pequeno porte;
b) a boa saúde;
c) a docilidade;
d) a permanência na unidade autônoma.


O STJ (Superior Tribunal de Justiça) já se pronunciou a respeito dessa matéria em três oportunidades, louvando-se em voto do eminente Min. Sálvio de Figueiredo, quando proclamou:

"Direito Civil. Condomínio. Animal em apartamento. Vedação na convenção. Ação de natureza cominatória. Fetichismo legal. Recurso inacolhido, Segundo doutrina, a possibilidade da permanência de animais em apartamento reclama distinções, a saber:

a). se a convenção de condomínio é omissa a respeito;
b)se a convenção é expressa, proibindo a guarda de animais de qualquer espécie;
c) se a convenção é expressa, vedando a permanência de animais que causam incômodo aos condôminos.

Na segunda hipótese (alínea b), a reclamar maior reflexão, deve-se desprezar o fetichismo normativo, que pode caracterizar o "summum jus summa" injuria, ficando a solução do litígio na dependência da prova das peculiaridades de cada caso. Por unanimidade, não conhecer do recurso" (STJ - REsp. 12.166, RJ; relator Min. Sálvio de Figueiredo; 4.1 T.; j. 07.04.1992; DJ 4.05.1992; p. 5.890).

“Condomínio - Cão mantido em apartamento. Transtorno, desassossego e apreensão a outros condôminos - Ação cominatória procedente - Recurso improvido. Ainda que a existência de cláusula na convenção de condomínio, ou em regulamento, proibindo a manutenção de animais nas unidades autônomas, por si só, não seja suficiente para impedir o condômino de tê-los consigo, desde que a permanência do animal acarreta transtorno, desassossego e apreensão a outros moradores do edifício, impõe-se a sua retirada" (STJ - Decisão 07.04.1992 Processo: REsp. 12.166; ano 91; RJ; 4.a T.).
"Direito Civil. Condomínio. Assembléia Geral. Imposição de multa pela manutenção de animal em unidade autônoma. Nulidade de deliberação. Convenção e Regimento Interno. Precedente da Turma. Recurso Desacolhido.

I - Ao condômino, assiste legitimidade para postular em juízo a nulidade de deliberação, tomada em assembléia- geral, que contrarie a lei, a convenção ou o regimento interno do condomínio.

II- A exegese conferida pelas instâncias ordinárias as referidas normas internas não se mostra passível de análise em se tratando de recurso especial (Enunciado 5 da Súmula/STJ).

III - Fixado, com base em interpretação levada a efeito, que somente animais que causem incômodo ou risco á segurança e saúde dos condôminos é que não podem ser mantidos nos apartamentos. Descabe, na instância extraordinária, rever conclusão, lastreada no exame da prova, que conclui pela permanência do pequeno cão" (STJ -Resp 10.250; 4.a T.; DJU 26.04.1993; p. 7.212; unânime).
Para finalizar temos que todos os condôminos possuem direitos que decorrem das condições de proprietário, outros, da condição de comunheiros, pela coisa indivisa. O uso livre da coisa comum só encontra limite, na proibição de perturbar o uso da outra parte, art. 1.335 do Código Civil. A coisa deve ter uso de acordo com o seu destino ou natureza, proibindo-se ao condômino o uso diverso do normal, de forma a prejudicar a tranqüilidade dos demais condôminos, que também são proprietários do bem indiviso.


Assim, podemos afirmar que em havendo litígio, deve prevalecer o bem estar do Condomínio (maioria) em detrimento da vontade individual do proprietário do animal que causa prejuízos á tranqüilidade dos vizinhos, situação a ser analisada de acordo com as peculiaridades de cada caso em concreto.
Fonte: MARIANA HORACIO GEA MARTINEZ - OAB-SP 240.504


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