Nos Condomínios Edilícios é bastante comum existência de um zelador, que mora no próprio prédio, em local a ele especialmente destinado, para que possa atender, nas vinte e quatro horas do dia, toda e qualquer situação que exija os préstimos inerentes á sua função, ou seja, aquelas que demandem conhecimentos básicos da estrutura do edifício.
Porém, não raras vezes, a figura desse profissional entra em desuso, até pela terceirização implantada em ritmo cada vez mais acelerado, apesar dos riscos envolvidos. Quando tal ocorre surge a questão: o que fazer com tal espaço que se torna ocioso ?
Para esta mudança de destinação, como é cediço, indispensável prévia aprovação em assembleia. Mas não é qualquer número de pessoas que pode aprovar tal medida. Necessário observar “quorum” mínimo para tanto, nos termos da legislação vigente, uma vez que a inobservância implicaria da nulidade de tal deliberação.
E qual seria este? Seria unanimidade dos condôminos, ou seja, 100%, por se tratar de área comum, nos termos do art. 1.351 2ª. parte do CC vigente ?
Felizmente a resposta é negativa.
Muito embora seja área comum, não o é para uso de todos, mas sim de determinada pessoa, no caso o zelador. Por essa razão não se exige aprovação de 100% dos condôminos, cuidando-se de fato “atípico”, sem previsão legal expressa, daí a exigir um viés analógico dos dispositivos em conjunto, criando-se a regra própria para o fato em julgamento.
Neste sentido, TJRS, Apelação Cível- nº 70013832241; Décima Sétima Câmara Cível; Comarca de Porto Alegre, julgamento realizado em 24 de janeiro de 2006, Relatora a ilustre Desembargadora Rosaura Marques Borba, de onde se extrai, com grifos nossos:
“(...) Não há dúvida que a área destinada ao apartamento do zelador e assim planejada e construída originalmente integra as partes comuns do condomínio, no que diz com a co-titularidade entre os condôminos. Contudo, tem que se ter presente que embora parte comum, isso não significa que se trata, segundo a destinação que a convenção lhe atribuiu, área de uso comum, porque, uma vez cumprida sua destinação, estaria resguardada ao uso privativo do zelador, com todas as reservas constitucionais e legais que qualquer moradia detém no ordenamento pátrio.”
“É de se destacar, outrossim, que há muito a unidade deixou de ser utilizada para o fim que originalmente se lhe previu. O condomínio não conta mais com zelador residente no local, encontrando-se a mesma absolutamente desocupada- e, portanto, á revelia da função social- a gerar ônus sem qualquer bônus para a coletividade.”
“De sorte que se a proposta em jogo não é alteração é de parte comum e de uso também comum, se não implica modificação na estrutura ou aspecto arquitetônico do prédio;se não está se alterando o destino do edifício ou de qualquer unidade autônoma- matérias que a coletividade entendeu necessário o consenso de todos os condôminos-, porque a exigência de ‘quorum’ unânime, quando cediço a grande dificuldade de ser o mesmo alcançado em qualquer grupo social? A admitir-se o enquadramento ‘in casu’ a tal norma convencional, que há de ser compreendida de forma restritiva, estar-se-ia impondo uma situação ás avessas, onde apenas um ou dois condôminos imporiam sua vontade á vontade da maioria, o que o princípio das decisões democráticas em qualquer coletividade repele.”
“Ademais, a proposta de modificar a destinação da área vem em benefício do grupo, na medida em que o apartamento se encontra ocioso, gerando custos desnecessários, enquanto que sua transformação em um salão social, dar-lhe-á também a característica de uso comum, o que por si só já se mostra vantajoso. (...)”
Em suma, entendemos que com aprovação de 2/3 dos condôminos (e não apenas dos presentes) o destino da unidade do zelador pode ser alterado, seja para sua conversão em salão de festas, seja para locação, mantendo sempre o caráter de área comum.
Leva-se em consideração que a proposta em jogo longe está em implicar na alteração de destino de área de uso comum, menos ainda constituindo modificação da estrutura ou do aspecto arquitetônico do condomínio, mas, sim, de decidir o melhor aproveitamento da coisa comum, ou seja, casa do zelador.
Então, impor aos condôminos o quorum de 100% dos condôminos, é evidente, inviabilizaria a aplicação da função social da propriedade e do princípio que protege os interesses da massa condominial, haja vista a dificuldade de reunião de vários condôminos, notadamente, em edifícios com várias torres e número incontáveis de moradores.
É claro que se o intuito for alienar e transformar a unidade do zelador em unidade autônoma, necessários 100% dos condôminos do Edifício. Do contrário, a fim de garantir a prevalência dos interesses da massa condominial, permite-se que a decisão sobre o melhor aproveitamento da casa do zelador seja aprovada por quorum de 2/3 da totalidade dos condôminos.
Fora disso, corre o Condomínio o risco de decisão desfavorável em demanda judicial que venha a ser promovida por condômino movido por interesses nem sempre nobres.
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