MONOGAMIA
Recente decisão do Superior Tribunal de Justiça negou pedido de indenização feito por uma mulher que afirmou ter mantido um relacionamento afetivo com homem casado durante dois anos, prestando-lhe serviços domésticos, ou seja, típicos da antiga dona de casa, eis que para tanto tivera de deixar o emprego.
Assim, o fundamento para negar o pedido de indenização foi a diferença existente entre “união estável”, pública e o concubinato, “clandestino”. A família, base da sociedade, recebe especial proteção do Estado, conforme aduz o artigo 226 e seguintes da Constituição Federal.
O caso específico, na realidade, como dito acima, tratava-se de uma relação de concubinato, pois sequer residiam sob o mesmo teto, diferenciando-se do conceito de “família”, modificado ao longo dos tempos. A propósito, in verbis:
“Concubina, no dizer da jurisprudência, é ‘a amante, a mulher dos encontros velados, freqüentada pelo homem casado, que convive ao mesmo tempo com sua esposa legítima’ (RE 83.930-SP, rel. Min. Antônio Neder, RTJ 82/933); ‘é a que reparte, com a esposa legítima, as atenções e assistência material do marido’ (RE 82.192-SP, rel. Min. Rodrigues Alckmin); ‘é a mulher do lar clandestino, oculto, velado aos olhos da sociedade, como prática de bigamia e que o homem freqüenta simultaneamente ao lar legítimo e constituído segundo as leis, (RE 49.195, conceito expendido pelo Juiz Osni Duarte Pereira e adotado pelo Em. rel. Min. Gonçalves de Oliveira, RF 197/7). A companheira, por seu turno, ‘é a mulher que se une ao homem já separado da esposa e que a apresenta á sociedade como se legitimamente casados fossem’ (RE 49.185, RF 197/97); ‘é a mulher que une seu destino ao do homem solteiro, viúvo, desquitado ou simplesmente separado de fato da mulher legítima. Sua característica está na convivência de fato, como se casados fossem aos olhos de quantos se relacionem com os companheiros de tal união. Pesam no conceito as exigências de exclusividade, fidelidade, vida em comum sob o mesmo teto com durabilidade. O vínculo entre os companheiros imita o casamento, ou no dizer tradicional, é more uxório. Todo o relacionamento se faz ás claras, sem ocultação. Os dois freqüentam a sociedade onde, reciprocamente, se tratam como marido e mulher’ (Mário Aguiar Moura, RT 519/295). A distinção entre os dois conceitos acha-se convenientemente gizada pelo Em. Min. Antônio Neder, no trecho que transcrevo do voto proferido do RE 83.930-SP, verbis: ‘Todavia, em jurídica linguagem é de se admitir a diferenciação, porque, na verdade, o cônjuge adúltero pode manter convívio no lar com a esposa e, fora, ter encontros amorosos com outra mulher, como pode também separar-se de fato da esposa, ou desfazer desse modo a sociedade conjugal, para conviver more uxório com a outra parte. Na primeira hipótese o que se configura é um concubinato segundo o seu conceito moderno, e obviamente a mulher é concubina; mas, na segunda hipótese, o que se caracteriza é uma união-de-fato (assim chamada por lhe faltarem as justas nuptiae) e a mulher merece a vida como companheira; precisando melhor a diferenciação, é de se reconhecer que, no primeiro caso, o homem tem duas mulheres, a legítima e a outra; no segundo, ele convive apenas com a companheira, porque se afastou da mulher legítima, rompeu de fato a vida conjugal’”
Diante da explanação acima exposta podemos concluir que concubina é a conhecida “amante”, aquele se ligado ao homem ou mulher casada, enquanto companheira ou companheiro liga-se á pessoa solteira, viúva, desquitado ou separado de fato, apresentando-se como se casados fossem, ao contrário do concubinato, o qual não se identifica com o casamento, constituindo somente uma relação extraconjugal, conhecida como traição, frequentemente ocorrida ás escondidas, de forma velada.
Portanto, a decisão do Superior Tribunal de Justiça teve amparo nesta diferenciação, protegendo de modo absoluto o casamento e a união estável. E nem poderia ser diferente, porque ao assumir uma relação extraconjugal, cientes de tais circunstâncias, as partes envolvidas assumem o risco gerado pela situação, não cabendo eventual indenização, uma vez que não existem os direitos e deveres inerentes ao casamento e á união estável, tampouco se trata de uma relação sólida.
Do contrário haveria proteção em demasia ás relações extraconjugais, em detrimento do casamento, o que não se afigura razoável. Deve o direito primar pela proteção da situação que condiz com a moral e os bons costumes, como o casamento e a união estável, protegendo, assim, o patrimônio do casal.
Vale ressaltar que os casos devem se analisados um a um, porque ao direito também repugna o enriquecimento sem causa e prestigia a boa fé, razão pela qual, poderia existir situação na qual, ainda que sob o pálio do concubinato, formaram patrimônio comum, dispendendo esforços em conjunto, o que gerará direito á partilha de bens ou indenização correspondente.
Nesse sentido, ensina a Professora Maria Helena Diniz, esclarecendo que doutrina e jurisprudência dispõem a respeito da possibilidade de partilha do patrimônio constituído em sociedade de fato concubinária, reconhecendo tal direito á concubina.
Confira-se (Curso de Direito Civil Brasileiro, 5º volume, Direito de Família”, Editora Saraiva, São Paulo, 5ª edição, 1989, pág. 217):
“Embora a união concubinária não gere conseqüências idênticas ás do matrimônio, a legislação extravagante e a jurisprudência têm evoluído no sentido de possibilitar que produza alguns efeitos jurídicos, como:
......................................................................................................................
14) Conceder á companheira, por ocasião da dissolução da concubinagem, no patrimônio conseguido pelo esforço comum, por existir entre os concubinários sociedade de fato (RT 277:290, 435:101, 417:168, 405:48, 411:335, 490:109, 505:110, 526:73, 537:92, 540:216,; RTJ 56:429, 69:466, 75:936, 75:965, 70:108; RJTJSP 29:43, 28:79, 28:134; RJTJRS 76:116)”.
Finalizando, o profissional do direito deve legar sempre em conta que o direito existe para servir á justiça, de sorte que se tiver de optar entre eles, por não ter o legislador conseguido prever todas as situações, não poderá ter dúvidas de qual lado se posicionar, para que ocorra pacificação de conflitos, gerando tranquilidade social.
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